Entre ciganos e não-ciganos…
Os ciganos, originários do Norte da Índia, foram entrando na Europa até chegar à Península Ibérica e a Portugal nos séculos XIV e XV. Num primeiro momento bem acolhidos, mas à medida que os Estados se afirmaram e chamaram a si o controlo de todos os grupos nacionais, surgiram as dificuldades, que historicamente o poder político procurou ultrapassar através da repressão.
Esta relação conflituosa, ao longo de séculos, foi gerando de um lado e do outro representações de grande desconfiança, levando à cristalização de estereótipos e ao isolamento das comunidades. Mas durante muito tempo, as comunidades ciganas apenas mantiveram relações com não ciganos em contextos de trocas comerciais ou de prestação de serviços, sobretudo nas zonas rurais. Só recentemente houve a compreensão de que esta população era alvo de exclusão social e se entendeu ser necessário alterar as políticas e promover ativamente a sua inclusão.
Mas o que separa ciganos e não-ciganos?! As diferenças serão tão profundas que impeçam um relacionamento saudável?! Nem por isso.
Sob o ponto de vista cultural verificamos que existem traços comuns. O Prof. Gunther Dietz, autor do relatório “O Estado e os Ciganos em Espanha”, argumenta que os valores tradicionais dos ciganos, como a família, a noção de honra ou a autoridade concedida pelas famílias aos “anciãos”, são conformes aos conceitos da cultura maioritária. Junta-se a isto o valor da palavra dada, a ideia do presente, a proteção das crianças e a solidariedade são, igualmente, alguns dos traços que encontramos nestes grupos. E este conjunto de valores contribui para a manutenção da hierarquia no seio da família e para a preservação do grupo, o que favorece o reforço da sua identidade tal como acontece no grupo maioritário.
A coexistência entre ciganos e não-ciganos é boa e possível. E o maior exemplo desse bom relacionamento acontece por exemplo na Andaluzia, sul de Espanha. Tal como em Portugal, os cidadãos espanhóis de origem cigana viveram – e em certas regiões ainda vivem –, com altos e baixos, sempre com os mesmos problemas: pobreza, discriminação e dificuldades de integração. Mas a Andaluzia é um exemplo na integração. Por exemplo, nas províncias de Granada e Sevilha, as duas mais importantes regiões de concentração de “gitanos” em Espanha e na Europa as trocas interétnicas e a reciprocidade são muito frequentes. E há ainda um detalhe, de peso: o Flamenco, um dos símbolos espanhóis, nascido na Andaluzia entre os ciganos. Demonstra bem até que ponto a cultura cigana pode ser absorvida tornando-se parte integrante da sociedade.
Concordo plenamente com uma perfeita convivência entre ciganos e não ciganos derrubando a desconfiança existente entre ambas as partes e que se constitui em uma barreira difícil de transpor. Convém destacar com relação ao flamenco que ele representa para a Espanha além de símbolo, uma fonte de recurso turístico para o país.